O transporte urbano e a COP30

13/11/2025
Francisco Christovam
Francisco Christovam


Entre os dias 10 e 21 de novembro, em Belém, no Pará, será realizada a

30ª edição da Conferência das Partes (Conference of the Parties), que
reunirá representantes de alto nível de 170 nações signatárias de
convenções internacionais, voltadas para questões ambientais. O termo
COP é geralmente associado à Conferência das Partes da Convenção-
Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC), que
ocorre anualmente com o objetivo de debater e definir estratégias de
enfrentamento às mudanças climáticas.
Durante as reuniões e apresentações previstas na programação da
COP30, especialistas e técnicos de diversos setores da economia, de
órgãos governamentais, de universidades e de entidades da sociedade
civil apresentarão análises, estudos, diagnósticos, prognósticos e
propostas relacionadas às mudanças climáticas em curso. O objetivo
principal dos debates será discutir as causas e buscar soluções para
mitigar os impactos das atividades humanas sobre o meio ambiente,
cujos efeitos já são observados e tendem a impactar a vida no planeta,
de forma global.
No contexto das discussões sobre emissões totais de gases de efeito
estufa (GEE), o Brasil ocupa, atualmente, a sexta posição no ranking
mundial, estando atrás apenas de China, Estados Unidos, Índia, União
Europeia e Rússia, e respondendo por cerca de 3,1% das emissões
globais. Este cenário evidencia a relevância das políticas públicas e das
ações voltadas à redução de poluentes, especialmente quando se
considera o papel do transporte coletivo urbano.
A série histórica da evolução das emissões nacionais totais, por setor de
emissão, produzida pelo Observatório do Clima e apresentada no
Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito
Estufa (SEEG), revela pontos importantes. Ao longo das últimas três
décadas, os setores "Mudanças de uso da terra e floresta" e
"Agropecuária" são aqueles que emitem mais gases de efeito estufa no
país, respondendo por 42% e 29%, do total das emissões,
respectivamente. Já o setor "Energia", no qual está inserida a categoria
"Transportes", é o responsável por 20% das emissões. No ano de 2024,
foi emitido no Brasil um total de 2,145 GtCO 2eq de gases de efeito estufa.
De acordo com documento publicado pela Associação Nacional de
Transportes Públicos (ANTP), em julho de 2024, intitulado 'Rotas
Tecnológicas de Descarbonização do Transporte Coletivo no Brasil', os
ônibus urbanos a diesel, juntamente com os rodoviários e de fretamento,
representam uma parcela pouco significativa das emissões nacionais de
gás de efeito estufa: "comparados ao total das emissões brutas de GEE
do País (2,4 GtCO 2eq ), os ônibus urbanos a diesel – incluídos os
rodoviários e fretamento – contribuem com (22 MtCO 2eq ), pouco menos
de 1% das emissões nacionais". Vale ressaltar que, de acordo com os
levantamentos do SEEG, nos dois últimos anos, praticamente, não houve
alteração na contribuição das emissões de gás carbônico, proveniente
dos ônibus que operam no transporte urbano.
Ainda assim, a transição da matriz energética dos ônibus urbanos
destaca-se como um processo fundamental, já que as emissões desses
veículos afetam, diretamente, a qualidade do ar e a saúde das pessoas
que vivem e circulam nos grandes centros. Desta forma, o debate sobre
a descarbonização do transporte coletivo urbano está intrinsicamente
ligado à busca de soluções para mitigar a poluição em áreas densamente
povoadas, contribuindo para tornar as cidades mais sustentáveis e
ambientalmente mais equilibradas.
A modernização da frota de ônibus, ao longo das últimas décadas,
contribuiu de forma significativa para a redução das emissões de gases
de efeito estufa nos centros urbanos. Grande parte desse avanço foi
possibilitada pelo Programa de Controle da Poluição do Ar por Veículos
Automotores (Proconve), que não só impulsionou o desenvolvimento
tecnológico da indústria nacional, como também promoveu melhorias
consideráveis na qualidade dos combustíveis utilizados. Além disso, o
Proconve proporcionou um avanço expressivo de toda a cadeia de
serviços e insumos ligados ao setor de ônibus, favorecendo a adoção de
práticas mais sustentáveis e mais eficientes.
A introdução da nova geração de motores a diesel, conhecida como
EURO 6 (Proconve P8), a partir de janeiro de 2023, representou uma
melhoria na redução das emissões de poluentes, especialmente de
material particulado (MP) e de óxidos de nitrogênio (NO x ). A renovação
da frota, com a substituição dos ônibus equipados com motores EURO 3
ou EURO 5 por veículos com tecnologia EURO 6, contribui, de forma
relevante, para a melhoria da qualidade do ar nas cidades brasileiras.
Atualmente, as principais opções tecnológicas, em uso e em
desenvolvimento, que buscam reduzir a utilização de combustíveis
fósseis, incluem ônibus equipados com motores elétricos, alimentados
por baterias ou células de hidrogênio, além de veículos com motores a
combustão, que utilizam gás biometano ou biocombustíveis, como o
HVO (obtido pelo hidrotratamento, com hidrogênio, de óleos vegetais e
gorduras animais) ou o BeVant (um metil éster bidestilado, também
produzido a partir de óleos vegetais e gordura animal). Tanto o HVO, que
não é produzido no Brasil em escala comercial, como o BeVant, ainda
em fase de testes, são considerados combustíveis "drop in", ou seja,
substituem o óleo diesel, em quaisquer proporções, sem a necessidade
de grandes alterações nos motores originais.
Estas alternativas encontram-se em diferentes fases de desenvolvimento
tecnológico e nem todas estão aptas para serem implementadas em
larga escala ou disponibilizadas, amplamente, no mercado. É importante
destacar que, praticamente, todas essas soluções exigem aportes
expressivos de recursos, tanto em infraestrutura de abastecimento, como
na aquisição de novos veículos. Além disso, os investimentos iniciais e
os custos operacionais atuais dessas tecnologias ainda superam os
montantes exigidos pelos ônibus convencionais, movidos a diesel, de
porte similar.
No momento, a tração elétrica, com energia proveniente de baterias, é a
solução mais viável e algumas cidades estão iniciando seus processos
de substituição da frota diesel por ônibus elétricos. Atualmente, 30
municípios brasileiros já operam mais de mil ônibus elétricos, de
diferentes fabricantes, e quase todos estão enfrentando os problemas
próprios de uma mudança tecnológica adotada sem muito planejamento
e sem a elaboração de um projeto, que considere as questões técnicas,
econômico-financeiras, operacionais e, principalmente, de infraestrutura
viária e de infraestrutura elétrica, para a carga e recarga das baterias dos
veículos.
No entanto, a transformação significativa nas condições climáticas dos
grandes centros urbanos não depende apenas da troca do tipo de
combustível utilizado nos motores, sejam eles elétricos ou a combustão.
O verdadeiro impacto ocorre com a substituição do transporte individual
pelo transporte coletivo, que emite, em média, oito vezes menos
poluentes por passageiro transportado do que um carro. Ao reduzir a
quantidade de carros e de motos em circulação e ampliar a participação
dos ônibus, na matriz de transporte das cidades brasileiras, é possível
promover rapidamente uma diminuição expressiva da poluição ambiental
e, consequentemente, melhorar de forma substancial a qualidade de vida
nos centros urbanos.
Antes mesmo da adoção de tecnologias inovadoras, que exigem
investimentos elevados e a elaboração de projetos específicos, é
fundamental que o poder público foque em aprimorar a qualidade do
serviço oferecido à população, tornando o transporte coletivo mais
eficiente, confortável e atrativo para os passageiros. Melhorias na
regularidade, pontualidade e integração entre linhas, redução no valor
das tarifas públicas, além da modernização da comunicação com os
clientes e da infraestrutura – pista de rolamento, abrigos e pontos de
parada, terminais de transferência –, são ações imprescindíveis para
estimular o uso do transporte coletivo e, assim, potencializar o impacto
das futuras iniciativas de descarbonização da frota e de inovação
tecnológica.
Embora seja praticamente impossível antecipar as conclusões dos
debates que ocorrerão durante a COP30, no contexto do transporte
urbano de passageiros, é fundamental que as recomendações e as
propostas priorizem, clara e objetivamente, o fortalecimento do transporte
coletivo em relação ao transporte individual. Além disso, é importante
considerar novas estratégias de financiamento, tanto para os
investimentos em infraestrutura e aquisição de ônibus, como para o
custeio da manutenção e da operação dos sistemas.